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A difícil arte de ser fundamental

Muitos médicos, na correria de suas rotinas, não analisam a constituição de suas agendas, e por isso não avaliam a fidelização de seus pacientes. As atribulações deixam essa análise pouco objetiva, pois se transformam em vagas sensações. Estes profissionais “acham” que seus pacientes estão seguindo o tratamento prescrito, e também “acham” que eles estão retornando no prazo recomendado.

Outros, que utilizam as ferramentas dos sistemas de gerenciamento de suas clínicas para acompanhar o fluxo de sua clientela, se ressentem do baixo índice de retorno e de adesão de seus pacientes, e tentam buscar explicações para isso.

Se aos primeiros faltam as rotinas de analisar os hábitos de seus clientes (o mais básico dos fundamentos para qualquer empresa de serviços), aos demais, muitas vezes faltam sistematizações de ações para aumentar a fidelização, ou mesmo impedir o abandono do tratamento.

Várias razões podem ser apontadas para a baixa fidelização, e as respostas vão evidentemente variar caso a caso. A própria dinâmica do atendimento médico por meio dos planos de saúde estimula a baixa fidelização. Os clientes das operadoras (que representam hoje uma grande parte do movimento de consultórios, clínicas e hospitais nas maiores cidades brasileiras), seguem a seguinte lógica: consideram que pagam muito por seus planos, e por isso devem “usar bastante”. Isso explica o fato da escolha do profissional ou serviço se dar por comodidade e praticidade, já que a busca por uma segunda, terceira, ou mesmo quarta opinião, só requer disponibilidade de tempo.

Para aumentar a fidelização, é preciso, antes de qualquer coisa, entender os mecanismos de escolha e adesão ao tratamento de seus pacientes. Embora os mecanismos se alterem em função da especialidade médica e das características próprias da clientela atendida, normalmente o processo de seleção começa com um incômodo associado a um problema de saúde. Esse incômodo leva à busca de informações sobre os profissionais que poderiam atendê-lo. Em seguida, o paciente faz sua escolha entre as opções disponíveis (neste momento, podem ser consideradas as opiniões de amigos, a lista de credenciados por seu plano, ou ainda localização do consultório, por exemplo). Feita a escolha, ele marca a consulta. Após a mesma, avalia-a de forma global, considerando desde o atendimento que recebeu ao telefone, até a confiança transmitida pelo médico. Se o primeiro serviço consultado não parecer convincente, outros serão visitados, até que se dê a efetiva escolha.

Se a essência da adesão está nesta questão, a pergunta seguinte é: como tornar-se “A ESCOLHA”?

Questões que seriam acessórias ao atendimento médico se transformam em critérios de escolha, porque todo ser humano analisa seus relacionamentos como se os colocasse em uma balança: os problemas ficam de um lado, as coisas boas de outro. Se o “lado bom” pesa mais, o relacionamento é mantido. Todo o trabalho de marketing em um serviço de saúde deve se concentrar em tornar o serviço oferecido não apenas adequado, ou mesmo importante, mas sim fundamental.

Há várias pequenas ações que podem contribuir para que o atendimento se torne mais confiável e consistente. Algumas passam pelo lado de fora do consultório, e envolvem desde o atendimento telefônico até o ambiente físico, passando pelo treinamento da equipe de suporte. Outras estão concentradas na “hora da verdade”, no relacionamento médico-paciente. Estas ações podem e devem fazer parte da rotina de atendimento. Também é fundamental estruturar um programa que lhe permita manter contato sistemático com pacientes atuais e ainda acompanhar o comportamento de pacientes que parecem estar abandonando o tratamento. Em serviços maiores, focados no tratamento de pacientes crônicos, pode ser interessante pensar em manter um funcionário (ou estagiário) responsável por manter esses contatos e oferecer feedback.

Em minha opinião, a questão de tornar-se fundamental pode ser resumida da seguinte forma: é preciso investir constantemente, e sempre, e mais, na humanização do atendimento, pois é isso que faz, na prática, um serviço diferente dos demais.

Alice Selles